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Sumário
Prefácio Antirracismo e luta de classes no Brasil: Um diálogo entre teoria, experiência e revolução
Parte I - Formação social brasileira: da escravidão ao capitalismo dependente
Racismo, superexploração e a classe trabalhadora no Brasil
Cristiane Luiza Sabino de Souza
Das Convergências à Resistência: Os Processos Comuns de Marginalização de Indígenas e Negros no Brasil
Well Leal
Uma perspectiva indígena sobre racismo e luta de classes
Porakê Munduruku
O pensamento sexual em obras de Gilberto Freyre e Paulo Prado: Notas críticas sobre o mito da liberdade sexual brasileira
Lucas Brito
Transição capitalista e racismo em São Paulo (1850-1930)
Gabriel dos Santos Rocha
Parte Il - Mulher, raça e classe: do movimento de mulheres negras ao feminismo negro
Gênero, Raça, Classe e Teoria da Reprodução Social: caminhos para a reconstrução de uma análise estrutural do capitalismo
Rhaysa Ruas
A revolução no Brasil será negra e feminina, ou não será revolução
Luciana Araujo
Parte Ill - Protesto Negro: resistências do século 21
Além da aparência, além da essência: uma leitura marxista sobre a questão do "pardo"
Bárbara Araújo Machado
A categoria genocídio negro na luta antirracista
Alexis Pedrão
A Ditadura e o Movimento Negro: experiência revolucionária de negras e negros
Sandra Regina Vaz da Silva
Racismo e suas consequências na sociedade: qual é a importância de se ter uma educação antirracista, e quais os impactos na saúde mental e no mercado de trabalho?
Liliane Lima
Um diálogo sobre escrevivências
Michelly Santiago
Aquilombamento: resistência, afeto e luta
Vanderléia Reis
Pardismo, uma ideologia reacionária
Gabriel Santos
Parte IV - Estratégias para a revolução brasileira
A cabeça pensa onde os pés pisam: a luta antirracista contemporânea no capitalismo dependente brasileiro
Marcio Farias
Protesto Negro no Brasil: a luta antirracista contemporânea no capitalismo dependente brasileiro
Simone Nascimento
Não copiar, traduzir: Socialismo como Utopia concreta
Fábio Nogueira
Organização de ideias sobre estratégia e tática para o movimento negro brasileiro na atualidade
Matheus Gomes
Sobre as
autoras e autores
Prefácio
Antirracismo e luta de classes no Brasil: Um diálogo entre teoria, experiência e revolução
O presente livro é fruto do seminário "Antirracismo e Luta de Classes no Brasil" (realizado nos dias 16, 17 e 18 de maio de 2025 e transmitido pelo Esquerda Online), que foi um espaço político-acadêmico singular para a ref lexão sobre a interseção entre raça, classe e gênero no contexto brasileiro contemporâneo. Organizado pelas correntes Resistência e Insurgência do PSOL, o evento reuniu militantes, acadêmicos e artistas de diversas regiões do país para debater e articular estratégias de resistência que integrem o antirracismo à luta socialista, numa perspectiva que se aprofunda na teoria marxista dos séculos 20 e 21. O debate central do seminário evidencia a necessidade urgente de resgatar a dimensão racial na análise da sociedade brasileira, compreendendo a identidade negra e as experiências vividas por essa população, tanto no Brasil quanto no conjunto da diáspora, como categorias analíticas centrais. Nesse sentido, a reflexão sobre raça não se limita a uma abordagem culturalista ou simbólica, mas se insere na compreensão das relações de poder, exploração e opressão que estruturam o capitalismo brasileiro. Como Frantz Fanon observa no livro Em Defesa da Revolução Africana, "a consciência nacional das massas colonizadas não é apenas uma reação às condições materiais de opressão, mas também uma reconstrução da subjetividade própria, imprescindível à luta por libertação" (Fanon, 1968, p. 42). Aplicada ao contexto brasileiro, essa perspectiva nos convoca a pensar a questão racial como eixo central da transformação social, articulando a luta antirracista com a emancipação econômica e política.
A experiência do dia um do seminário, registrada nos vídeos do evento, trouxe à tona a importância de articular teoria e prática política, discutindo como a opressão racial está entrelaçada às relações de classe. Ao longo das mesas, foram analisadas estratégias históricas de resistência, incluindo movimentos de trabalhadoras e trabalhadores negros urbanos, comunidades periféricas e lideranças políticas da população negra. Nesse contexto, o pensamento de Thomas Sankara ? ao enfatizar a necessidade de uma revolução que priorize a autodeterminação das populações oprimidas ? ilumina o debate: "A revolução não é apenas um ato de tomar o poder; é também um processo de reconstrução da consciência coletiva de um povo" (Sankara, 1987, p. 19).
O segundo dia do seminário aprofundou a reflexão sobre gênero, identidade e cultura, destacando a obra de Lélia Gonzalez como referência para a articulação de raça, gênero e classe. Gonzalez nos lembra que "a mulher negra está na encruzilhada de opressões históricas e estruturais, e é justamente dessa posição que emerge uma perspectiva de resistência e reorganização social" (Gonzalez, 1988, p. 55). Essa análise permite compreender que a luta antirracista no Brasil não pode dissociar-se das demandas por justiça social mais ampla, incluindo a emancipação feminina e a superação das desigualdades de classe. Além disso, o seminário incorporou experiências históricas de militância revolucionária, conectando-as à teoria marxista, como exemplificado pelo legado dos Panteras Negras nos Estados Unidos. Fred Hampton, dirigente do Partido dos Panteras Negras, sintetizava a necessidade de unir a pauta racial a outras quando afirmava: "A opressão da nossa comunidade não é apenas racial, é também econômica e política. Devemos lutar em todas essas frentes simultaneamente" (Hampton, 1969, p. 33). Essa abordagem, aplicada ao contexto brasileiro, reforça a urgência de se construir categorias analíticas que unifiquem raça, classe e gênero como pilares de um projeto transformador. O terceiro dia do seminário enfatizou a dimensão revolucionária dessa articulação, discutindo estratégias de construção de um projeto socialista antirracista no Brasil.
A centralidade da população negra na construção de tais estratégias não apenas reconhece sua importância histórica, mas também coloca suas experiências vividas como instrumentos de análise e ação política. Nesse sentido, a perspectiva marxista do século 21 precisa dialogar, incorporar e buscar impulsionar a experiência negra, criando ferramentas analíticas que conectem a luta por justiça racial com a transformação radical da economia, da política e da cultura brasileiras. A proposta teórico-prática do seminário se alinha à perspectiva de Fanon, Sankara, Gonzalez e Hampton, articulando identidade, experiência e teoria em torno de um objetivo comum: a construção de uma Revolução Brasileira que tenha a questão racial no centro, mas que simultaneamente enfrente as desigualdades de classe e de gênero. Tal revolução, concebida a partir das experiências da população negra no Brasil e em toda a diáspora, requer não apenas estratégias políticas e organizativas, mas também uma transformação epistemológica: reconhecer a experiência negra como produtora de conhecimento crítico capaz de redefinir categorias de análise social e de abrir caminhos para a emancipação coletiva. Em síntese, o seminário e suas reflexões constituem um esforço articulado para fortalecer a interseção entre antirracismo e marxismo, criando um campo de análise e ação que reconhece as múltiplas dimensões da opressão, mas também aponta para a possibilidade concreta de transformação radical. Esse livro tem como objetivo aprofundar as discussões decorrentes dos três dias do seminário, pensando a luta antirracista a partir de uma perspectiva marxista contemporânea, que não deve ser apenas um exercício acadêmico, mas sim uma estratégia política indispensável para resgatar a centralidade histórica da população negra na construção da emancipação brasileira, considerando raça, classe e gênero como elementos inseparáveis na formulação de uma revolução que seja verdadeiramente popular, democrática e radical.